O amor é vitalício ou é um contrato a termo certo?



O “amor” é, atualmente, uma palavra gasta. As grandes odes ao amor ficaram perdidas algures na História para darem lugar às experiências efémeras, sexuais ou não, que, de amor, nada têm. Hoje em dia, basta meter conversa com qualquer pessoa numa rede social, marcar um encontro e ver no que dá. Umas vezes, não dá nada, noutras a química acontece. E depois da química e da física, o que sobra? Uma bela amizade ou uma memória esparsa? A meu ver é apenas uma experiência igual a tantas outras apenas com corpos diferentes, o que me faz questionar: que acrescento traz isto à vida de alguém?
Com a promiscuidade à mão de semear, as pessoas desacreditam no amor verdadeiro. É fácil trair, quebrar a confiança e humilhar o outro com comentários que tecemos pelas costas. À frente, são todos cordeiros com auréola de anjo; por trás, viram lobos falsos e astutos.
Acreditar que ainda há relações de amor bem-sucedidas é difícil. Hoje em dia, ninguém quer perder tempo a resolver problemas, quando é tão fácil cortá-los pela raiz. Amar verdadeiramente implica reconhecer e aceitar que o outro tem defeitos e virtudes, como nós. Diz-nos a lei do amor que devemos ser tolerantes com os erros dos outros. E eu questiono-me, até que ponto? O que é que deve ser perdoável? Onde termina a linha da razoabilidade? Termina no momento em que as ações dos outros nos fazem mal. Amar é também estabelecer limites emocionais. Sem jogos, sem enganos, manipulações emocionais ou violação dos valores. Aceitar que alguém nos maltrate ou nos engane numa relação, é anular a nossa identidade.
Não sabemos se amamos alguém da noite para o dia. Ter essa certeza requer tempo. Não posso dizer que amo alguém se não conhecer os anjos e os demónios que lhe habitam dentro. Não posso amar sem conhecer o feitio, o humor cortante, a raiva dissimulada, a maneira como fica quando está chateado e as suas contradições. Todos temos características difíceis. Eu própria sou um caos e, simultaneamente, dinamite. Ateio com facilidade. Conhecer os pontos mais negativos dessa pessoa e ainda assim amá-la, é algo especial. Mas uma coisa é feitio, outra coisa é carácter. Posso ter um feitio difícil mas os meus valores são íntegros e espero (digo mesmo, exijo!) o mesmo da outra pessoa. Caso contrário, não há futuro. Não podemos estar com quem pratica valores diferentes dos nossos.
Amar é cuidar nos detalhes. Não basta proferir palavras bonitas e as ações serem contrárias. Não basta dar abraços nos momentos bons, e esquecer de dá-los nos momentos maus. São as ações diárias que mostram o verdadeiro valor que alguém assume na nossa vida, mas o maior detalhe é mostrar ao mundo que aquela pessoa é importante.
Ao contrário do que as pessoas pensam, assumir um amor não é um ato de fragilidade. Porque amar não deve ser uma dependência. Amar não é precisar de alguém, é preferir a companhia de uma determinada pessoa. Eu não preciso de ti, mas prefiro ter-te na minha vida. Escolho-te, para que me acrescentes.
Da mesma forma, não existe amor à primeira vista. Ele não cresce do nada, constrói-se diariamente. A semente é lançada, com pequenas subtilezas aqui e ali, mas só floresce quando tem espaço. O amor deve ser construído com as fundações do respeito, do carinho e de uma amizade verdadeira. Só com o tempo nasce a cumplicidade, a intimidade e o querer ter esta pessoa dentro nas nossas vidas e dos nossos corações.
Sou crente no [meu] amor. Sou do tipo de teimosa que vai até à última. Sou persistente ao ponto de cansar o próprio destino. Acredito na ilusão de que tudo vai correr bem. Oiço mais do que falo. Observo, analiso, escrutino. Mas também acumulo. E é por isso que as pessoas me cansam. Porque, além de previsíveis, são pouco inteligentes, pouco genuínas e acabam por desencantar. Apesar de se acharem no domínio da situação, de terem uma resposta sempre na ponta da língua e de pensarem que estão a controlar graças às suas capacidades treinadas, ignoram que o controlo lhes foi dado naquele momento. Porque amar é, também, tapar os olhos de vez em quando, é fingir que acreditamos nas barbaridades que nos estão a dizer, é reagir com clareza de espírito quando a vontade é abandonar, gritar, desistir e arrasar com a pessoa de um só golpe. Amar é dar a oportunidade de ver se a semente floresceu e se vale a pena o investimento. Se esse amor apertar muito, é porque precisa de ser libertado.
Amor vitalício só conheço um, o amor-próprio. Os outros parecem ter termo certo, mas quero acreditar que esse contrato possa ser renovável ou efetivado até ao fim dos dias.

Sei lá, nasci crente.

© Laura Alho

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