Nem tudo o que é simples é fácil.



Um dos grandes paradoxos com o qual me tenho confrontado é que aquilo que é simples e aparentemente fácil é, na realidade, muito complicado de ser concretizado. Quando estamos perante uma situação que exige uma ação contrária àquela que queremos perpetuar (mudança), a lógica parece ser insuficiente para a tomada de decisão que sabemos ser a correta. A título de exemplo, pessoas que queiram deixar de fumar sabem quais são os malefícios de continuarem a fumar, mas continuam a fazê-lo porque não conseguem (leia-se: não querem) alterar o comportamento. A ação “deixar de fumar” é simples, mas a sua execução revela-se bastante complexa. Pessoas que são excessivamente auto-críticas sabem, em teoria, que devem ser gentis consigo próprias, mas dizer algo positivo em relação a si é uma tarefa hercúlea. Aliás, parece completamente ridícula, porque as pessoas sentem essas afirmações como sendo uma não verdade. O nosso cérebro é uma máquina incrivelmente astuta. Todos os programas que mandamos executar, ele executa e quando define um padrão de comportamento, assume que esse padrão é o que a pessoa quer e, por isso, procura contestar novas ordens, particularmente se forem contrárias ao que está habituado a concretizar. É importante que as pessoas saibam que o cérebro, em si, não quer saber o que é certo ou errado, saudável ou não saudável; os nossos programas de modelação e assimilação é que criaram um padrão de moralidade que, por exemplo, nos impede de bater nas pessoas sempre que elas nos irritam, porque se conhecem as consequências desse ato. Por isso é que as pessoas, quando fazem psicoterapia, têm muitas resistências em relação às técnicas que o profissional sugere fazer. Porque o cérebro vai assumir que a mudança é desnecessária, uma vez que sobreviveu até ali com aquele padrão de pensamentos e ações. Mas o maior sinal que as pessoas costumam ignorar, por não terem insight imediato sobre ele, é que a procura de ajuda significa que o modelo de pensamentos e comportamentos que executaram durante muito tempo, está a ser questionado. E quando algo é questionado, a dúvida surge e o modelo deixa de ser totalmente verdadeiro, abrindo brechas à mudança e criando conflito entre o modelo "antigo" e o que se está a tentar implementar.
A resistência à mudança é devida ao facto do nosso cérebro não gostar de sair da esfera do que lhe é familiar. O desconhecido fá-lo ativar uma série de linhas de programação pré-formatadas para evitar, a todo o custo, essa mudança. A boa notícia é que a partir do momento em que o programa é questionado, há abertura à introdução de novas ideias e de novos modelos. Mas para a mudança acontecer, é realmente necessário que a pessoa tenha vontade de fazê-lo e que assuma o compromisso de ser disciplinada nessa mudança. Voltar a cair no padrão antigo é fácil. É uma questão pseudo-endoevolutiva (a pessoa regressa à esfera familiar, mesmo sabendo, a determinada altura, que toda a sua vida está em sofrimento pelo modelo atual). Pequenas ações na rotina, que são tão simples de realizar aos olhos de uns, representam um verdadeiro pesadelo para outros. Sair do modelo disfuncional vai causar sempre resistência, mas o facto de parecer complexo não deve ser motivo para desistir de uma melhor qualidade de vida. Na verdade, muitas pessoas esquecem que quem comanda o cérebro somos nós e não o inverso. Deixar que seja ele a comandar-nos é uma questão de escolha que vai ter consequências inevitáveis.
 Da próxima vez que se deparar com tarefas simples e difíceis de executar, pergunte-se de onde vem essa resistência, porque descomplicando a coisa da forma mais rudimentar possível: o que é simples é realmente fácil de fazer, especialmente se for benéfico para si e, em consequência, para os outros. O que define como "complexo" é a razão última de evitamento do desconhecido que o/a impede de avançar e o mantém no útero do universo, sem que se liberte de lá.

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